Moléculas Poliatómicas
Hibridação sp: BeH2

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O berílio (configuração electrónica 2s22p0) tem quatro orbitais de valência e apenas dois electrões para as preencher. Assim, o berílio tem capacidade de estabelecer duas ligações covalentes «normais» - e duas ligações covalentes dativas nos casos em que se liga a elementos com orbitais totalmente preenchidas (os pares de electrões não partilhados).

A molécula de BeH2 é uma molécula linear em que o berílio estabelece duas ligações equivalentes, uma com cada átomo de hidrogénio. Recorrendo às orbitais atómicas «puras» do berílio, e considerando que na molécula o Be teria uma configuração electrónica 2s12p1, seria possível estabelecer uma primeira ligação Be-H utilizando uma orbital 2p semipreenchida do Be. Pelo critério da sobreposição máxima, esta ligação seria direccional.  Uma segunda ligação poderia ser estabelecida com a orbital 2s do Be, sendo em princípio adireccional dada a simetria esférica da orbita 2s. No entanto, a repulsão entre os electrões envolvidos nas duas ligações é mínima para um ângulo de 180º entre elas, sendo por isso esta a orientação de menor energia. Considerando o eixo dos xx o eixo internuclear, as orbitais 1s dos dois átomos de H terão então ambos sobreposição (interferência) tanto com a orbital 2s como com a orbital 2px do átomo de Be [link para moléculas diatómicas]. As orbitais 2py e 2pz do Be têm coalescência (sobreposição) nula com as restantes [link para moléculas diatómicas] permanecendo com carácter atómico (não ligantes). As 4 orbitais moleculares resultantes serão combinações lineares das orbitais 1s dos dois átomos de hidrogénio e das orbitais 2s e 2px do berílio, como indicado na Equação 1.  Os 4 electrões de valência do BeH ocupam as duas orbitais moleculares de menor energia.

ψi= ci1 φ2s (Be) + ci2 φ2px (Be) + ci3 φ1s H(1) + ci4 φ1sH(2)        (eq.1)

Na aproximação do enlace de valência, em que não se considera a formação de orbitais moleculares mas sim o enlace de orbitais atómicas, dá-se conta da mistura s-p que ocorre na molécula «misturando» as orbitais 2px  e 2s do berílio. De facto, os dois primeiros termos da Eq. 1  são combinações lineares das orbitais 2s e 2px do Be e o conceito de hibridação é assim simplesmente uma operação matemática que combina as orbitais atómicas do átomo isolado de forma a que as orbitais resultantes sejam consistentes com a interferência de mais do que duas orbitais.

As orbitais «híbridas» sp  têm a distribuição espacial representada na Fig.1. Dadas as simetrias das orbitais, a interferência das orbitais 2s e 2px será construtiva num dos «lados» do átomo, o semi-eixo positivo dos XX quando se considera a combinação em que ci1 e ci2  são ambos positivos (2s + 2px), e destrutiva no semi-eixo negativo. Na combinação em que ci1 = - ci2  ( 2s-2px), obter-se-à exactamente o oposto, interferência destrutiva no semi-eixo positivo e construtiva no semi-eixo negativo. Assim, enquanto uma orbital  p apresenta dois lóbulos iguais de ambos os «lados» do átomo, uma orbital sp apresenta o máximo de densidade electrónica apenas num dos «lados» com um pequeno lóbulo arredondado no semi-eixo oposto.  Da distribuição espacial das orbitais é também evidente que cada orbital 2sp tem sobreposição máxima com a orbital 1s de um dos átomos de hidrogénio. Da geometria das orbitais é expectável que um átomo central que apresente hibridação sp apresente igualmente uma geometria local linear (ou seja, espera-se que as ligações que estabelece façam entre si ângulos de 180º).

Orbitais atómicas "puras"
Orbitais híbridas

ψ1= 1/√2 φ2s + 1/√2 φ2px

ψ2= 1/√2 φ2s - 1/√2 φ2px

Figura 1- Combinação linear das orbitais 2s e 2px na hibridação sp.

As duas orbitais híbridas sp são equivalentes quer em termos energéticos quer de «composição»: as duas orbitais são degeneradas, com energia intermédia entre a energias das duas orbitais atómicas que lhe deram origem, e  apresentam 50% de carácter s e 50% de carácter p. As duas orbitais p que não entraram na hibridação permanecem «puras» e estão vazias no berílio que apresenta assim uma configuração electrónica: [He] sp1sp1pz0py0.

O BeH2 é então descrito como apresentando duas ligações σ (localizadas) resultantes da sobreposição ou enlace topo a topo das orbitais 1s do hidrogénio com as orbitais híbridas sp do berílio.

Figura 2- Orbitais atómicas envolvidas na ligação química no BeH2 .

Note-se que esta descrição simples tem limitações, e que dela resultam previsões em claro contraste com as derivadas da TOM. Por exemplo, a representação da Fig. 2 sugere que as duas orbitais σ são degeneradas e com contornos de isoprobabilidade simétricos em relação ao eixo dos xx. De facto, as orbitais σ têm energias diferentes e os respectivos contornos de isoprobabilidade não são simétricos (Fig. 3) mas as ligações formadas são equivalentes em termos de distâncias internucleares e em termos energéticos como previsto pelo modelo do EV. Assim, desde que as suas limitações sejam tidas em conta, o Enlace de Valência tem a enorme vantagem da sua simplicidade, em particular na descrição de moléculas grandes.

Orbitais moleculares do BeH2
Figura 3 - Diagrama de energia das orbitais moleculares e contornos de isoprobabilidade orbital da molécula de BeH2